A tributação liga-se, em suas raízes históricas, às homenagens, às dádivas, aos tributos concedidos aos deuses, depois à realeza ou ao poder dominante de uma região. Embora pudesse constituir uma oferta voluntária, logo se tornou instrumento compulsório da autoridade dominante. Cobrava quem tinha o poder para tanto, obtido normalmente em guerras sangrentas. Os despojos dos vencidos constituíam o tesouro dos vencedores. Com o tempo, os romanos, além das riquezas extraídas dos povos subjugados, já instituíam impostos de seus próprios cidadãos, na importação ou no consumo de bens. Os gregos já o entendiam, também, como uma forma de garantir o bem comum.
Passados séculos, embora a separação dos Poderes e as garantias legais, o Estado continuou sustentado pelos burgueses e trabalhadores, sendo isentos de tributação o clero e a nobreza. De forma geral, portanto, sempre pagavam tributos aqueles que estavam em condições subalternas em relação ao poder tributante. No Brasil, a inconformidade com a tributação excessiva, sem a contrapartida de benefícios visíveis, levou ao movimento da própria Independência do país. Historicamente, em nossa formação cultural, inclusive, restaram reminiscências do conceito de que o tributo nos é extorquido para a garantia da satisfação de outrem.
Com o progresso, o poder tributante passou a ser cada vez mais entendido como forma de repartir as riquezas, reduzir as desigualdades e garantir o bem comum, ninguém podendo se escusar às suas prestações, quando devidas.
É reconhecido, entretanto, que deve assegurar os recursos necessários à defesa da sociedade sem interferir indevidamente na economia. Deve ser neutro, portanto. Aparentemente, deveria ter apenas funções fiscais, não extrafiscais. Como instrumento de poder, entretanto, é muito usado, com finalidades diversas da mera arrecadação, o que, por si só, não chega a constituir um mal. O desequilíbrio no seu direcionamento para funções extrafiscais, entretanto, pode ocasionar uma forte e indevida intervenção nos mercados.
A neutralidade da imposição tributária exige que os tributos não prejudiquem nem favoreçam segmentos específicos da economia, nem ocasionem impacto na concorrência. A nossa própria Constituição, por outro lado, garante que incentivos fiscais podem ser concedidos quando visem promover o equilíbrio, isto é, incentivar regiões desfavorecidas.
Sendo o Brasil um país de extenso território, com grandes diferenças regionais, torna-se necessária a descentralização do poder político. A possibilidade de adoção de medidas adaptadas às necessidades regionais é um útil instrumento de progresso. O exercício do poder tributante, entretanto, ante a demanda insaciável por recursos, tem sido desequilibrado. Há utilização excessiva dos tributos para metas extrafiscais, para atrair empresas, gerar empregos ou, mesmo, em medidas protecionistas, fazer frente às práticas predatórias adotadas por outros entes tributantes.
A criação de “paraísos fiscais” no âmbito do ISS e os incentivos fiscais do ICMS têm afrontado a neutralidade tributária, com grandes prejuízos para quase todos. Os incentivos devem ser concedidos para favorecer o desenvolvimento econômico, não aumentar as desigualdades.
Empresas que oferecem mercadorias com diferenças substanciais nos preços, por exemplo, nem sempre encontraram mecanismos mais eficazes de produção. Frequentemente, escondido sob a vantagem competitiva, encontra-se algum incentivo tributário. Deixa de ser preponderante a modernização de processos, por vezes, assumindo hierarquia indesejável o planejamento tributário.
O empresário, entretanto, ao selecionar fornecedores ou efetuar marcação de preços, nem sempre tem condições de avaliar com profundidade as causas e as consequências das diferenças competitivas. Constantemente, pensando ter exaurido todas as suas obrigações relativamente aos produtos que comercializou, vê-se surpreendido com exações fiscais a questionar a licitude dos procedimentos ou dos próprios créditos de ICMS efetuados.
Por outro lado, as diferenças nas legislações dos Estados têm aberto caminhos para eficientes planejamentos tributários, ensejando o fechamento de operações com real conhecimento de causa, aproveitando as diferenças entre os tratamentos fiscais concedidos. As possibilidades de ganho, para quem explora estas diferenças, oferecem real vantagem competitiva num mercado cada vez mais agressivo e, ainda, a segurança de procedimentos rigorosamente dentro das previsões das legislações vigentes. No mínimo, o conhecimento das peculiaridades instrumentaliza o empresário para tomada de decisão com real conhecimento dos riscos envolvidos em cada operação, evitando surpresas desagradáveis.
Embora indesejável, a chamada “guerra fiscal” é uma realidade de nosso mundo. Aqueles que a ignoram tem sofrido prejuízos incalculáveis. Atualmente, aliás, as empresas precavidas, munidas de eficientes consultorias tributárias para garantia de sua sobrevivência, estão deixando de estar à mercê das diferentes imposições tributárias e, tomando a iniciativa, estão estudando profundamente as possibilidades lícitas de economia tributária que a “guerra fiscal” ocasiona. Em relação aos tributos, a ignorância custa muito caro.
Quem perde com as disputas entre os entes tributantes não é mais o empresário, individualmente considerado, que já se precatou com eficiente planejamento tributário, mas os próprios Estados e Municípios que, num processo de autofagia, aniquilam as riquezas mútuas, sem ganho real de longo prazo. Quem perde, enfim, somos todos nós, cidadãos, que continuamos a pagar os tributos aos detentores da política pública, sem poder exercer com eficiência nosso dever de manifestação quanto ao direcionamento destes recursos.