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A penhora de quotas e o novo CPC

Até 2015, as quotas ou ações de uma sociedade – ou seja, a participação no capital social de uma empresa -, nunca representaram bens atrativos para credores

Autor: Marco Aurélio MedeirosFonte: O Autor

Até 2015, as quotas ou ações de uma sociedade – ou seja, a participação no capital social de uma empresa -, nunca representaram bens atrativos para credores. Isso porque adquirir quotas de sociedade em um leilão significa comprar uma caixa preta: a empresa pode estar bem ou não, ter débitos já vencidos e declarados, ou contingências que representarão uma dívida futura. Como se não bastasse, seria preciso ainda confiar nos demais sócios e em sua capacidade de administrar o negócio. Até negócios sem débitos, com dinheiro em caixa, sócios engajados, motivados e afinados, dão errado; imagine o risco de se tornar sócio de uma caixa preta – e pior: na condição de algoz do antigo sócio, o devedor.

Essa dificuldade acaba se tornando um benefício para quem busca proteção patrimonial: no lugar de manter bens em nome da pessoa física, incorpora-os em uma pessoa jurídica – uma holding patrimonial – e assim, mesmo na existência de dívidas inesperadas, o patrimônio está a salvo, pois raramente serão penhoradas as quotas dessa holding; para quem está de fora, não é uma mina de ouro, mas a caixa preta.

Claro que proteger o patrimônio em um país como o Brasil, onde a segurança jurídica esbarra no messianismo de governantes e legisladores, onde a lei – por vezes – se enverga de acordo com as convicções não jurídicas do julgador, se torna prática aconselhável não só aos mal intencionados. O objetivo não é deixar de pagar, mas ter tempo para discutir a dívida, percorrer todas as instâncias judiciais, bem como assistir ao amadurecimento de leis intempestivas e, não raro, inconstitucionais.

O Código de Processo Civil de 2015 muda um pouco esse panorama. Agora, a penhora de quotas não objetiva mais levá-las a leilão, mas a liquidação da sociedade no quinhão do devedor para que o seu resultado satisfaça ao credor. O art. 861 do novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), determina que penhoradas as quotas ou as ações de sócio em sociedade simples ou empresária, o juiz assinará prazo razoável, não superior a três meses, para que a sociedade:

  1. apresente balanço especial, na forma da lei;
  2. ofereça as quotas ou as ações aos demais sócios, observado o direito de preferência legal ou contratual;
  3. não havendo interesse dos sócios na aquisição das ações, proceda à liquidação das quotas ou das ações, depositando em juízo o valor apurado, em dinheiro.

De acordo com os parágrafos 1º e 3º do dispositivo acima mencionado, a sociedade poderá evitar a liquidação, adquirindo as próprias quotas; e para que a liquidação seja efetiva, o juiz poderá nomear administrador que determinará – após a aprovação judicial – a forma de liquidação. Com isso, acaba a caixa preta. Esgotadas as tentativas de constranger bens mais valiosos, penhorar quotas ou ações será sempre interessante ao credor: na inexistência de valor relevante no balanço ou no resultado da liquidação, abate-se apenas parte do débito, mas ele (credor) nada perde.

Naturalmente que existem diversas outras questões de fundo. A liquidação, em geral, se dá pelo patrimônio líquido e nem todas as empresas fazem a avaliação a valor justo (AVJ): isso significa que imóveis comprados no passado e valorizados não estarão totalmente representados no balanço, logo, o pagamento do resultado da liquidação pela própria sociedade é bem menos oneroso do que perder tal imóvel em um leilão. Ativos intangíveis, do mesmo modo, raramente estão bem valorados em um balanço.

No que se refere à fruição dos bens, as quotas de uma sociedade podem ser transferidas muito mais facilmente, e sem obrigação de apresentação de certidões ou registro cartorário, do que um imóvel ou um veículo. Em igual sentido, bens em nome da sociedade podem ser vendidos mesmo após o início da execução sem que tal fato represente uma fraude a credores ou à execução, visto que o devedor/executado é o sócio, e não a sociedade.

Há ainda questões tributárias, sucessórias, dentre outras que justificam – e recomendam – o uso de uma holding patrimonial. Contudo, com a mudança de procedimentos, credores e devedores (esses, bem ou mal intencionados) precisarão atualizar seus métodos.

*Marco Aurélio Medeiros (marco@msaonline.adv.br) é advogado pós-graduado em Direto da Economia e da Empresa e em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Mestre em Contabilidade Tributária pela FUCAPE/RJ. Ex-professor de Direito Empresarial da Universidade Estácio de Sá e ex-auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro. É sócio da MSA Advogados e atua nas áreas de planejamento tributário e empresarial.

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