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Os impactos jurídicos e as cautelas necessárias diante da onda crescente das "Mães de bebês Reborn"

Nos últimos anos, um fenômeno peculiar tem ganhado proporções relevantes no Brasil: O crescimento da comunidade de mulheres que se identificam como "mães de bebês reborn"

Trata-se de um movimento social e emocional em que pessoas, majoritariamente mulheres, cuidam de bonecos hiper-realistas como se fossem filhos de verdade, com rotinas que incluem alimentação simbólica, troca de fraldas, consultas pediátricas fictícias e até a exigência de direitos semelhantes aos de mães biológicas ou adotivas.

Este artigo tem por objetivo analisar os possíveis impactos jurídicos deste fenômeno e apontar cautelas que os departamentos jurídicos, sobretudo de instituições públicas, clínicas, empresas e operadoras de saúde, devem adotar diante dessa crescente demanda social.

Inicialmente, entendo ser crucial abordarmos a Linha Tênue entre Liberdade Individual e Desvio de Realidade.

A Constituição Federal de 1988 assegura, no art. 5º, o livre exercício de qualquer atividade lícita, bem como a proteção da dignidade da pessoa humana. Assim, o ato de tratar um boneco como filho pode ser compreendido como expressão de liberdade individual. No entanto, surge um ponto de atenção:

Em que momento essa manifestação extrapola o limite da vida privada e passa a exigir reconhecimento institucional ou jurídico incompatível com a realidade dos fatos?

Se uma "mãe reborn" solicita licença maternidade, prioridade em filas de banco ou atendimento preferencial no SUS, temos aí uma fronteira delicada entre o respeito à saúde mental e a proteção contra abusos no uso de políticas públicas e benefícios legais.

Esse fenômeno crescente pode esbarrar no Direito Coletivo quando, por exemplo, solicitações de documentos ou serviços públicos são feitas com base em vínculos inexistentes do ponto de vista jurídico. Algumas situações que já foram relatadas em redes sociais ou à imprensa incluem:

  • Pedido de certidão de nascimento fictícia para o boneco;
  • Tentativas de obtenção de licença-maternidade junto ao INSS;
  • Requisições de atendimento prioritário em serviços públicos.

Tais pedidos, embora motivados por sentimentos legítimos ou até por condições clínicas como o luto ou transtornos afetivos, não encontram respaldo legal, podendo, inclusive, configurar tentativa de fraude à legislação previdenciária ou administrativa.

O jurídico de órgãos públicos deve estar atento a esse tipo de demanda e responder com empatia, mas também com firmeza legal, evitando precedentes que coloquem em risco a isonomia e a racionalidade dos direitos sociais.

RESPONSABILIDADE CIVIL E O LIMITE COM A SAÚDE MENTAL: QUANDO O JURÍDICO DEVE AGIR COM RESPONSABILIDADE CLÍNICA E INSTITUCIONAL

Ademais, o fenômeno das "mães de bebês reborn" pode parecer apenas uma manifestação excêntrica ou uma forma inofensiva de lidar com o luto, traumas ou frustrações emocionais. Contudo, há casos em que essa prática ultrapassa a esfera da autonomia privada e passa a gerar impactos concretos sobre terceiros ou sobre o funcionamento institucional, é neste ponto que o Direito deve atuar com mais rigor.

Quando Extrapola a Responsabilidade Civil?

A responsabilidade civil é acionada quando há lesão a um direito ou um dano efetivo causado a outrem, seja por ato comissivo ou omissivo. No contexto das mães de bebês reborn, extrapola-se a esfera da liberdade individual quando, por exemplo:

  • O uso do boneco passa a gerar transtornos ao ambiente de trabalho ou atendimento público;
  • exigência de direitos que não têm previsão legal, como prioridade em fila, matrícula escolar ou atendimento pediátrico para o boneco;
  • A recusa da instituição ou empresa em atender ao pedido gera reclamações, exposições públicas ou processos por suposta discriminação, com fundamento em direitos que não se aplicam a bonecos.

Esses casos podem gerar prejuízos à imagem de uma empresa, constrangimento a funcionários e até judicialização indevida, configurando assim o dever de resposta institucional.

Quando Devemos Passar a Analisar a Saúde Mental?

O ponto crítico surge quando as atitudes da pessoa deixam de ser isoladas e passam a demonstrar descolamento da realidade, com reações emocionais intensas, crises em locais públicos, insistência em situações que ultrapassam o razoável e até mesmo agressividade diante de negativas administrativas. Aqui, a atuação jurídica não pode se limitar ao Direito, sendo necessário considerar o fator clínico.

Nesses casos, o jurídico deve:

  • Identificar sinais de vulnerabilidade emocional ou possível transtorno psicológico;
  • Consultar ou acionar a área de assistência social ou psicologia institucional, quando houver;
  • Orientar a equipe de atendimento a agir com empatia, sem validar juridicamente o vínculo inexistente, mas com respeito à condição emocional da pessoa;
  • Redigir respostas jurídicas cuidadosamente redigidas, que não ridicularizem, mas também não reconheçam qualquer direito inexistente.

Qual atitude adotar juridicamente?

Frente a esse tipo de situação, a melhor estratégia é o equilíbrio entre o respaldo legal e a sensibilidade humana. O departamento jurídico deve:

  1. Redigir pareceres ou notas técnicas preventivas, orientando setores como RH, SAC, atendimento ao público e ouvidoria sobre como proceder.
  2. Elaborar protocolos padronizados de atendimento, com linguagem acolhedora e embasada juridicamente, que protejam a instituição contra acusações infundadas, mas também evitem violações à dignidade do indivíduo.
  3. Quando necessário, registrar formalmente os episódios para eventual uso futuro em defesa judicial, inclusive com documentos que comprovem que não houve ofensa, mas sim aplicação da legislação vigente.
  4. Sugerir mediação institucional com apoio de profissionais da saúde mental, especialmente se houver reincidência ou agravamento do comportamento.

O fenômeno das mães de bebês reborn é, antes de tudo, um reflexo das transformações emocionais e psíquicas da sociedade contemporânea. O jurídico não pode ignorar o aspecto humano por trás dessas manifestações, mas tampouco pode sucumbir a pressões emocionais que contrariem a ordem legal.

A missão, portanto, é construir um posicionamento técnico, sensível e preventivo, que oriente decisões institucionais e preserve os princípios constitucionais, evitando que o excesso de concessões abra precedentes prejudiciais à coletividade.

REFERÊNCIAS

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2022.

  1. ENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2023.
  2. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
  3. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 48. ed. São Paulo: Malheiros, 2022.
  4. BRASIL. Lei nº 10.216/2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais.
  5. BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de Atenção Psicossocial em Situações de Emergência. Brasília: 2020.
  6. CAMPOS, Gastão Wagner de Sousa; BENEVIDES, Regina. O cuidado em saúde mental: desafios do modelo substitutivo. In: Revista Ciência & Saúde Coletiva, vol. 21, n. 5, 2016.

Conselho Federal de Psicologia (CFP). Resolução CFP nº 010/2005

Sobre o autor:

ALINE XAVIER DOS SANTOS - Advogada no Vigna Advogados, Pós graduada em Direito Penal e Processo Penal e pós-graduanda em Direito Bancário e Mercado Financeiro pela PUC Minas e certificação. CPA-10 em andamento

Sobre o escritório:

Fundado em 2003, o VIGNA ADVOGADOS ASSOCIADOS possui sede em São Paulo e está presente em todo o Brasil com filiais em 15 estados. Atualmente, conta com uma banca de mais de 280 advogados, profissionais experientes, inspirados em nobres ideais de justiça. A capacidade de compreender as necessidades de seus clientes se revela em um dos grandes diferenciais da equipe, o que permite desenvolver soluções econômicas, ágeis e criativas, sem perder de vista a responsabilidade e a qualidade nas ações praticadas.

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