O movimento de corte de juros em algumas linhas de financiamento, liderado pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil, tem tudo para beneficiar o tomador de crédito, uma vez que estimula a competição entre os bancos e abre espaço para a troca de dívidas caras por mais baratas. Em reação à investida das instituições públicas, o HSBC, por exemplo, já anunciou redução de juros em três modalidades de crédito voltadas para a pessoa física.
Mas a concorrência só se tornará efetiva se o consumidor buscar as menores taxas, mesmo que isso signifique mudar de instituição. "Ele é quem tem de provocar isso, os bancos tendem a reagir de acordo com a pressão do cliente", afirma Miguel Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
"A única coisa que faz baixar preço é concorrência", reforça Roque Pellizzaro Junior, presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). A entidade, juntamente com o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), lançou uma campanha para orientar os mais de 800 mil lojistas associados a estimular consumidores endividados a renegociar suas dívidas, aproveitando os juros mais baixos.
Só que antes de sair trocando de banco, o cliente precisa pesquisar as condições das ofertas, alerta Marta Aur, assessora técnica do Procon-SP. Nem sempre o juro mais baixo está acessível a todo mundo, já que os bancos podem negociar condições diferenciadas dependendo do cliente e do produto ou serviço a ser contratado.
No BB, o programa de crédito recém-lançado traz mais vantagens para quem transferir o recebimento do salário para a instituição e aderir a um dos pacotes de serviços, cuja tarifa varia de R$ 18,00 a R$ 54,00, informou o banco, por meio da assessoria de imprensa. Só para esse cliente, o juro cobrado no rotativo do cartão de crédito (quando se rola a dívida para o próximo mês) será de 3%. Para os demais, a taxa pode variar de 3,96% a 13,62% ao mês.
As taxas do crédito pessoal foram mantidas, assim como as do cheque especial, entre 1,97% para quem recebe o salário na instituição e 8,31% mensais. O programa apenas instituiu para esses que têm conta salário o benefício de usar o limite por 10 dias sem juros e o parcelamento automático da dívida com taxa de 3% ao mês se o cliente usar mais que 50% do limite por 60 dias consecutivos. No caso do financiamento de veículos e de bens de consumo, o corte vale para todos os clientes e potenciais clientes, independentemente de terem conta-salário.
A Caixa também oferece condições especiais para quem tiver conta-salário na instituição. No cheque especial, esses clientes terão acesso a uma taxa de 3,5% ao mês. Para os demais, os juros serão de 4,27%, ainda assim uma redução de 59% em relação aos 8,25% ao mês válidos anteriormente e praticamente metade da cobrada pelos maiores bancos do varejo (9,25%, na média, segundo dados de abril divulgados pelo Procon).
No rotativo do cartão de crédito, as taxas caíram cerca de 40%, começando em 2,85% para quem tem conta salário, e indo até 9,47% ao mês. "Todo mundo será beneficiado pela redução, e os que tiverem o salário na instituição terão vantagens adicionais", explica Fábio Lenza, vice-presidente do segmento de pessoa física da Caixa.
A instituição aproveitou ainda para lançar um programa de organização financeira para a pessoa física. O objetivo é oferecer alternativas para melhorar o perfil de dívida do cliente por meio de linhas mais baratas, do alongamento de prazos e até da obtenção de novos recursos.
Mesmo se depois da pesquisa as ofertas dos concorrentes mostrarem-se mais vantajosas, Marta, do Procon-SP, diz que vale a pena buscar uma negociação com o gerente do próprio banco. "Eventualmente, ele pode cobrir a oferta", diz. Ainda segundo a assessora da entidade, o consumidor precisa ter cautela para não cair em armadilhas. Entre os cuidados, Marta diz que é preciso desconfiar das supervantagens e prestar atenção para não aumentar excessivamente o endividamento, alongando prazos, ou ainda ficar engessado ao concentrar todas as operações em um único banco.
Oliveira, da Anefac, lembra que o cliente precisa comparar os custos do conjunto de serviços que ele usa no banco, não apenas de uma ou outra linha de crédito. Pellizaro, da CNDL, acrescenta que, dependendo do prazo restante da operação, pode não valer a pena transferir a dívida. "Se estiver faltando uma ou duas parcelas, a diferença de custo será pequena", pondera.
Contudo, para o vice-presidente da Anefac, o momento não poderia ser mais propício para discutir a portabilidade de crédito. "As condições para o crédito hoje estão melhores do que há seis meses e as taxas vão continuar caindo com a redução da Selic." Outra razão é o movimento iniciado pela Caixa e pelo BB de corte de juros. "Há uma expectativa grande que os bancos privados também reduzam suas taxas", continua. O HSBC já deu o primeiro passo.
Oliveira sugere, no entanto, que o consumidor espere mais um pouco. Nesta semana, lembra, há a expectativa de que o Comitê de Política Monetária (Copom) corte a Selic em mais 0,75 ponto, para 9% ao ano.
A portabilidade permite ao consumidor transferir o crédito de uma instituição para outra. O instrumento também pode ser usado para a migração da conta-salário. Maria Elisa Novais, gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), explica que a portabilidade de crédito entrou em vigor em setembro de 2006, para aumentar a concorrência.
Segundo ela, o consumidor, ao identificar uma taxa de juros mais atrativa, deve procurar o banco que está fazendo a oferta, fazer uma simulação e verificar as condições que ele oferece. Se todos os critérios forem cumpridos, deve solicitar ao banco detentor de suas dívidas que disponibilize as informações acerca dos saldos devedores e pedir a portabilidade na nova instituição financeira.
O banco que estiver recebendo o crédito é o responsável por liquidar a operação com a instituição que concedeu os recursos, sem envolvimento do consumidor. A transação é isenta de custos e tarifas, salvo se o cliente aproveitar para tomar mais recursos.
A portabilidade de crédito mais frequente é do consignado, modalidade em que o juro é mais baixo, há disputa entre correspondentes bancários e a possibilidade de tomar mais recursos depois de algumas parcelas pagas.
Já a transferência de financiamento imobiliário e de veículos é mais complexa. No primeiro caso, envolve serviços como certidões de cartório de imóveis, que, na troca de instituição, precisam ser emitidas novamente. O custo é do cliente. No financiamento de veículos, a necessidade de realização antecipada da baixa do gravame na instituição financeira que está liquidando a dívida restringe a portabilidade. Procurados, o Itaú Unibanco, o Bradesco e o Santander não quiseram conceder entrevista.