A parcela dos empregados no país que trabalham 49 horas ou mais por semana –cumprindo jornadas diárias de 10 horas em média– atingiu seu menor nível nos últimos quatro anos. É mais um reflexo da crise e da deterioração do mercado de trabalho, que tem provocado redução de horas extras nas empresas.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, muitos empregadores têm recorrido a esse expediente para evitar ainda mais demissões. Embora ajude a preservar empregos, o corte das horas extras reduz a renda dos trabalhadores e seu potencial de consumo.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ao fim do segundo trimestre deste ano, a parcela de pessoas que trabalhavam 49 ou mais horas por semana esteve restrita a 10,9%. No primeiro trimestre de 2012, início da série histórica das estatísticas do instituto, esse grupo representava 16,9%.
Queda semelhante ocorreu com a parcela dos que trabalham entre 45 e 48 horas semanais –recuo de 5,9 pontos percentuais para 11,8% no segundo trimestre deste ano.
Em 2012, a economia ainda vivia momentos de bonança e a demanda aquecida permitia que as empresas tivessem grande contingente de funcionários complementando a rotina com horas extras.
"O empregador negocia redução da carga horária em resposta a uma demanda que não está aquecida", afirmou Bruno Alfano, da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
De acordo com o economista Marcelo Azevedo, da CNI (Confederação Nacional da Indústria), o movimento ocorre principalmente nas fábricas. Além do alto custo para demitir uma pessoa no Brasil, as empresas querem evitar gastos com o treinamento de novos funcionários quando a economia melhorar.
"Muitas vezes, a melhor saída é reduzir o número de horas, evitando, assim, a demissão", disse Azevedo.
A CNI tem um índice que mede o nível das horas trabalhadas na indústria. O indicador é expresso em uma base fixa em pontos, em que 100 é equivalente às horas trabalhadas na indústria em 2006.
Em agosto, por exemplo, o índice foi de 84 pontos, o menor nível desde dezembro de 2015, de 88. Antes, o pior desempenho havia sido em agosto de 2003, 90,4 pontos.
"Meses sucessivos de quedas de horas pagas indicam que esse movimento pode passar para o desemprego efetivo", afirmou o economista-chefe do IEDI, Rafael Cagnil. "Empresas de montagem, de bens de consumo duráveis em geral, tendem a adotar mais frequentemente esse tipo de estratégia."
As montadoras lançaram mão da prática com frequência. Segundo a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), das 126 mil pessoas empregadas no setor em agosto, 22,3 mil estavam afastadas, em férias coletivas, ou layoffs ou no PPE (Programa de Proteção ao Emprego), com carga horária reduzida.
O programa prevê redução em 30% do salário do trabalhador, e governo e empresa dividem o custo do salário. Há também redução das horas trabalhadas por semana.
Segundo o técnico da coordenação de emprego e renda do IBGE, Cimar Azeredo, os trabalhadores que estavam na ponta das 49 horas por semana estão migrando para o grupo de 40 a 44 horas semanais –cerca de 8 horas por dia–, o padrão brasileiro.
"Os grupos estão tentando se ajustar nas 40, 44 horas. Em geral, as pessoas fazem horas extras para complementar a renda, mas com a crise os empregadores perdem capacidade de pagar mais. O primeiro movimento é reduzir essa quantidade de horas", disse.